Entre as várias criações exclusivas italianas dos anos 1960, a Lancia Loraymo ocupa um lugar bem particular não só por ser um exemplar único, mas também por levar a assinatura de um designer industrial conhecido pela criação de muitos ícones do cotidiano: Raymond Loewy.
O projetista franco-americano foi o responsável pelos desenhos do maço de cigarros Lucky Strike (1942), das geladeiras Frigidaire OMM-74 (1950), da garrafa alongada da Coca-Cola “KS” (1955), do logotipo da Shell (1971) e até da pintura do avião presidencial Air Force One (1962).

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Fonte: Motor1.com
Para quem curte carros, porém, Loewy ficou mais conhecido por ter revolucionado o desenho dos automóveis no pós-guerra, com o Studebaker 1947. A partir daí, os sedãs deixaram de ser “rechonchudos” e altos, para se tornarem mais esguios e com a estética de três volumes que conhecemos até hoje: frente, corpo central e um porta-malas bem destacado. Todo mundo copiou…
Empregando designers como Virgil Exner e Robert Bourke, o escritório Loewy and Associates criou ainda ícones como os Studebaker Starlight Coupé e a frente “bullet nose” (1950). Loewy apostava em um princípio que chamou de MAYA, abreviatura da “Most Advanced Yet Acceptable”, ou seja: o mais avançado possível de ser aceito pelos consumidores.

Foto de: Lancia
A Lancia Flaminia original, desenhada na Pininfarina (1958)
A Lancia franco-americana
No final da década de 1950, Raymond Loewy decidiu reinterpretar à sua maneira uma Lancia Flaminia Coupé (desenhada originalmente na Pininfarina, em 1957). O projeto de Loewy era pessoal, com o objetivo de expressar sua visão estética sem restrições, sem preocupações com o princípio MAYA.
Para dar forma ao carro, ele recorreu ao ateliê de Rocco Motto (Carrozzeria Motto), em Turim, especialista em carrocerias de alumínio. Já a parte mecânica ficou a cargo da preparadora Nardi, que retrabalhou o motor V6 2.5 original para elevar a potência de 119 cv para 142 cv.
O cupê ficou pronto em 1960, e Loewy ficou tão satisfeito com o resultado que resolveu apresentá-lo oficialmente ao público no 47º Salão de Paris, realizado naquele mesmo ano.
O nome “Loraymo” é um acrônimo de LOewy RAYMOnd – e também era o endereço telegráfico do estúdio do designer. Após a estreia, o carro foi usado por Loewy na Europa e depois levado para os Estados Unidos, onde foi conservado na coleção particular do designer (que morreu em 1986, aos 92 anos).
O cupê permaneceu durante anos como uma espécie de peça perdida. Só mais tarde foi redescoberto e doado à Lancia pelo então presidente do American Lancia Club.

Foto de: Lancia
Aerodinâmica à frente do tempo
O visual da Loraymo é tudo, menos discreto. A carroceria coupé é marcada por formas ousadas e soluções técnicas bem avançadas para a época. Na dianteira, o destaque vai para a grade afilada envolvida por uma moldura cromada que também funciona como um para-choque retrátil.
Toda a silhueta foi pensada com foco na aerodinâmica, com detalhes como calotas totalmente fechadas e um pequeno spoiler sobre o vidro traseiro – uma solução que só anos depois apareceria novamente, na lendária Lancia Stratos HF. O vidro traseiro panorâmico envolve toda a parte posterior e cobre o porta-malas, que só pode ser acessado por dentro do carro.
As maçanetas são embutidas nas portas, algo que só virou moda recentemente, após o lançamento do Range Rover Velar (2018). A traseira limpa conta com um para-choque cromado fino e lanternas bem horizontais. As duas saídas de escape, aliás, são os únicos elementos que rompem as linhas suaves da parte de trás.
Com velocidade máxima na casa dos 190 km/h, a Lancia Loraymo não é só um estudo de design: ela entrega desempenho acima da média para os padrões dos anos 1960. Hoje, faz parte do acervo histórico da Lancia, uma prova de que da união entre o gênio americano e o artesanato italiano podem surgir obras realmente únicas.
Em 1962, Loewy adotaria algumas das soluções da Lancia Loraymo em seu novo projeto para a Studebaker: o cupê de luxo Avanti. Mas essa já é outra história…